O conhecimento sobre a Covid-19 tem sido construído a cada dia, conforme avançam os estudos científicos sobre os sintomas, impactos para o organismo, desenvolvimento da imunidade e recuperação da doença. Da mesma forma, o aprendizado sobre as vacinas desenvolvidas contra o novo coronavírus é dinâmico, e ganha novos elementos conforme atravessamos a pandemia.
Entre as mudanças implementadas recentemente em relação aos imunizantes estão as doses de reforço e a adoção de intervalos menores entre as aplicações das vacinas que contam com esquemas de mais de uma dose.
O intervalo preconizado pelo Ministério da Saúde é de oito semanas para as vacinas da Pfizer e AstraZeneca e de quatro semanas para a Coronavac.
Para os brasileiros com viagens marcadas para o exterior, o ministério autorizou, no dia 22 de outubro, que o esquema vacinal seja completado em tempo reduzido. A recomendação é que seja respeitado o intervalo mínimo de 21 dias para a vacina da Pfizer e de 28 dias para a vacina da AstraZeneca.
Segundo um levantamento da Agência CNN, com base nas informações de secretarias estaduais de Saúde, pelo menos 16 estados e o Distrito Federal seguem a recomendação do Ministério da Saúde para o intervalo da Pfizer de 8 semanas. Em relação à AstraZeneca, 18 estados e o DF adotam os prazos preconizados pela pasta. Para a Coronavac, 15 estados e o DF acompanham o Ministério da Saúde (veja a relação no quadro abaixo).
A equipe da CNN não obteve retorno dos estados de Minas Gerais, Sergipe, Alagoas e Acre até o fechamento da reportagem.
O diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri, explica que alteração no intervalo entre as doses é uma prática comum, que já aconteceu em campanhas de vacinação para outras doenças. Segundo o especialista, a medida deve considerar as evidências científicas disponíveis.
“Para a AstraZeneca sabemos que intervalos de 8 a 12 semanas entre a primeira e a segunda dose são melhores do que de 6 a 8 semanas. Os estudos mostram que se obtém uma proteção mais elevada com intervalos entre 2 e 3 meses, são dados bastante documentados. Não há prejuízo nenhum de baixar de 3 para 2 meses”, diz Renato.
A opinião também é compartilhada pelo presidente do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI), João Viola. “As pessoas vão produzir a imunidade normalmente, estudos foram feitos e as decisões estão dentro do que está preconizado nas bulas das vacinas em suas diferenças de tempo da segunda dose”, disse.
O que dizem as bulas das vacinas
A bula da Pfizer indica como intervalo padrão o prazo de 21 dias entre a primeira e a segunda dose. Estudos realizados em países com grande número de casos da doença, como os Estados Unidos e o Reino Unido, indicaram que o sistema imunológico apresenta maior produção de anticorpos quando as doses são administradas com com um intervalo mais amplo.
Segundo o Instituto Butantan, os estudos clínicos realizados comprovaram a eficácia no intervalo de 14 e 28 dias entre as duas doses, como indicado na bula da vacina. Um estudo realizado por pesquisadores do instituto mostrou que a eficácia global da Coronavac, que considera a proteção contra casos leves, moderados e graves, foi de até 62,3% quando o intervalo entre as duas doses foi de 21 dias ou mais.
“Em relação à Coronavac, só temos dados de intervalo de 15 a 30 dias, mostrando que o prazo de 30 dias é melhor do que o de 15. Alguns estados que estão, equivocadamente, trazendo o intervalo para 15 dias, a meu ver não é a melhor alternativa em termos de resultado final de proteção”, ressalta Renato.
De acordo com a bula da vacina da AstraZeneca, a segunda injeção pode ser administrada entre 4 e 12 semanas após a primeira. Procurada pela CNN, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que produz as doses da AstraZeneca no Brasil, não respondeu até o fechamento da reportagem.
O último comunicado da Fiocruz sobre o tema foi uma nota oficial divulgada em julho, que reforçava a importância da manutenção do intervalo de 12 semanas entre as doses.
Fases da vacinação
A médica infectologista Rosana Richtmann, do Hospital Emílio Ribas, de São Paulo, explica que as campanhas de vacinação contra a Covid-19 podem ser adaptadas de acordo com o contexto epidemiológico e a disponibilidade de vacinas.
Segundo ela, no início da campanha de imunização no país, quando havia um grande número de pessoas não vacinadas e uma quantidade limitada de doses, foi preciso adotar o prazo máximo de intervalo entre a primeira e a segunda dose dos imunizantes.
Por isso, o intervalo estipulado para as vacinas da AstraZeneca e da Pfizer era de 12 semanas entre a primeira e a segunda aplicação. De acordo com Rosana, a adoção de um intervalo maior foi uma estratégia acertada que permitiu a vacinação de uma grande quantidade de brasileiros com ao menos a primeira dose.
De acordo com o Ministério da Saúde, já foram aplicadas mais de 271 milhões de doses no país, sendo 153 milhões como primeira dose, e 116 milhões como segunda dose ou dose única (vacina da Janssen).
Segundo Rosana, o momento atual da pandemia permite a redução no intervalo entre a primeira e a segunda dose, com o objetivo de otimizar a vacinação completa da maior parte da população. Para a especialista, a ampliação do número de pessoas com o esquema vacinal permitirá minimizar a transmissão do vírus.
“Se você tem pouca vacina, em termos de quantidade, e muita gente não vacinada, é preciso usar o máximo que puder de primeira dose para o maior número de pessoas, foi o que fizemos no início. Hoje, temos um número grande de vacinados e quantitativo maior de vacinas, agora queremos diminuir a transmissão do vírus, para isso, precisamos que o maior número possível de pessoas façam a segunda dose”, explicou.