Entenda os sinais do transtorno bipolar na adolescência
Saúde
Publicado em 13/09/2022
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Mudanças de humor são comuns em qualquer fase da vida. Na adolescência, as oscilações podem ser mais frequentes devido às alterações hormonais e corporais naturais desse período.
No entanto, especialistas alertam que altos e baixos frequentes e intensos podem indicar problemas mais sérios na saúde mental.
Neste Setembro Amarelo, mês que promove o apoio emocional e a prevenção ao suicídio, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) chama atenção para o cuidado em relação aos transtornos mentais em jovens.
O transtorno bipolar é uma manifestação de humor caracterizada pela alternância de episódios de depressão, mania ou hipomania. A doença crônica pode trazer sofrimento, afetando negativamente a vida dos pacientes em diversas áreas, em especial no trabalho, no lazer e nos relacionamentos interpessoais.
A bipolaridade traz prejuízos significativos para a qualidade de vida, devido aos altos e baixos de ânimo, alterações muito exageradas no nível de atividade ou atitude em curtos períodos. O transtorno pode se manifestar na infância e juventude, porém se detectado precocemente pode ser controlado desde o início.
O pediatra e psiquiatra Orli Carvalho, do Instituto Nacional de Saúde da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), afirma que na fase mais aguda do transtorno, tanto adolescentes quanto adultos podem pensar e falar sobre cometer suicídio.
“O transtorno afetivo bipolar, ou TAB, é conhecido há longa data, acomete de 1 a 3% da população global, sendo caracterizado por promover uma instabilidade e oscilação de humor e de comportamento, de forma prejudicial e não adaptativa ao paciente e aos seus pares. A caracterização desse prejuízo é importante para o diagnóstico, num reconhecimento que alterações de humor contextualizadas e harmônicas fazem parte do cotidiano da vida das pessoas, em diferentes idades. No TAB essas oscilações são disfuncionais, marcadas em fases e acompanhadas de sintomas e manifestações clínicas que trazem sofrimento psíquico ou consequências desagradáveis”, explica.
Embora as causas do transtorno bipolar sejam desconhecidas, hipóteses apontam o envolvimento de fatores genéticos, biológicos e psicossociais, como eventos adversos e traumáticos ao longo da vida;
“Podemos pensar que algumas pessoas carregam vulnerabilidades para o transtorno – a história familiar positiva nos dá uma grande pista para isso. Ainda assim, isso não define, pelo que entendemos hoje, quem pode desenvolver a doença”, diz Carvalho.
O reconhecimento das sinais do transtorno bipolar permite a busca por atendimento especializado e controle do problema. Para isso, além de identificar as características esperadas da adolescência, os profissionais de saúde devem conversar com a família para entender o contexto em que o jovem está inserido.
São reconhecidas no transtorno bipolar oscilações significativas de humor, com episódios depressivos alternando com episódios de euforia ou irritabilidade, também chamados de mania, se mais intensos, ou hipomania. “Episódios bem caracterizados, de intensidade relevante e de forma claramente disfuncional, segundo a fase da adolescência, as experiências de vida e os valores familiares e culturais. Episódios pouco explicados pelo contexto e até mesmo pelos adolescentes, e que interferem em sua estabilidade afetiva”, explica o especialista.
Na fase maníaca ou eufórica o adolescente pode apresentar agitação, irritação ou euforia; agressividade e hostilidade; pensamento, fala e movimentação acelerados; impulsividade e redução na capacidade de planejamento e avaliação de risco; sensação de grandiosidade e autoestima elevada; sensação de muita energia e pouca necessidade de dormir. Na adolescência, a irritabilidade pode ser mais comum do que a euforia.
Já na fase depressiva, há sinais de tristeza profunda e desesperança, desânimo ou cansaço, além da perda de interesse, de prazer e de motivação ou ideias sobre morte e suicídio.
“De uma maneira bem simplificada, temos alguns subtipos de TAB: tipo I: mania e depressão mais graves e intensas, tipo II: depressão maior e hipomania, e ciclotimia: hipomania e depressão menos intensas. Por vezes, essas manifestações ocorrem por outras condições médicas ou por uso de substâncias ou medicamentos, recebendo classificações específicas”, pontua.
O diagnóstico é clínico, feito a partir da história do paciente e de seus sinais e sintomas referidos e observados nas avaliações nas consultas. Não há exames que diagnostiquem o transtorno, ainda que alguns instrumentos possam ser um auxílio à entrevista clínica, sendo mais utilizados em pesquisas.
“O diagnóstico virá a partir do reconhecimento das oscilações significativas de humor, com episódios depressivos alternando com episódios de euforia ou irritabilidade, episódios bem caracterizados, de intensidade relevante e de forma claramente disfuncional, segundo a fase da adolescência, as experiências de vida e os valores familiares e culturais”, afirma Carvalho.
O especialista alerta que as dificuldades de acesso e as variações clínicas apresentadas favorecem o atraso no diagnóstico adequado, o que pode dificultar as intervenções possíveis.
“A importância de se pensar o TAB na adolescência é que sabemos hoje que 10 a 20% dos casos nos adultos se iniciaram antes da adolescência e que 60% dos casos se iniciam até os 20 anos de idade”, afirma.
O tratamento é realizado a partir do diagnóstico e varia conforme a gravidade e o momento da doença, como crise, manutenção ou prevenção de recaídas. As medidas podem variar também em fase de mania ou depressão.
“De forma didática, três grandes grupos de abordagens constituem o tratamento: suporte familiar e psicossocial, psicoterapia e farmacológica, como o uso de estabilizadores de humor, antipsicóticos e antidepressivos”, explica.
O psiquiatra defende o envolvimento de profissionais de diversas áreas, incluindo psicologia e a educação, na orientação do adolescente para a compreensão do transtorno. “Sendo comum a ocorrência de comorbidades do transtorno bipolar na adolescência, o tratamento precisa considerar a presença de outros problemas, assim como enfatizar o risco do uso abusivo de álcool e outras drogas”, orienta.
Carvalho explica que o transtorno bipolar é considerado um quadro crônico e não se considera a ideia de cura, mas de estabilidade nos sintomas de humor. “Entendemos que o tratamento, em suas diferentes modalidades, melhora a qualidade de vida, reduz as chances de internação e os riscos de suicídio, proporcionando que o adolescente siga de forma saudável na sua experiência de vida”, diz.
O planejamento de um tratamento envolve orientações sobre como agir em caso de crise, sendo algo individualizado para cada caso.
“No decorrer do tratamento, o adolescente e sua família vão aprendendo a identificar e manejar os gatilhos e os primeiros sinais de descompensação, algo muito importante diante de um quadro crônico, o que permite ajustes no tratamento antes que se estabeleçam situações de crise ou emergências. Os serviços de saúde que prestam assistência emergencial psiquiátrica e que podem ser acionados devem ser do conhecimento da família: algo também que precisa ser discutido ao longo do tratamento do adolescente”, afirma.
Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis (CAPSi), ambulatórios de psiquiatria e ambulatórios de psicologia oferecem atendimento para pessoas com transtorno bipolar. Para pessoas que estão em crise, o Centro de Valorização da Vida (CVV) disponibiliza a ajuda de especialistas durante 24 horas. Basta ligar para o telefone 188 ou acessar o chat pelo site. O site Mapa da Saúde Mental permite a consulta de locais que oferecem o atendimento gratuito, voluntário ou com preços acessíveis no país.
“Como ocorre em outros transtornos mentais, o suicídio deve ser uma preocupação quando estamos diante de casos de maior gravidade ou naqueles nos quais as modalidades de tratamento não se estabelecem. Assim, como o transtorno depressivo, o transtorno bipolar apresenta características que sinalizam a necessidade de atenção para com pensamentos sobre a própria morte. Em contrapartida, a literatura é clara sobre a drástica redução do risco de suicídio quando o adolescente com transtorno bipolar está em acompanhamento regular e possui boa rede de apoio”, conclui.
Fonte: CNN Brasil