No último dia de 2022, o Foo Fighters anunciou o que se esperava: a sequência de suas atividades. O luto pela perda de Taylor Hawkins, seu baterista desde 1997, foi respeitado por 9 meses - em meio a esse período, a própria banda o homenageou com dois eventos especiais no estádio de Wembley, em Londres (Inglaterra), e no Kia Forum, em Los Angeles (Estados Unidos).
Em um comunicado nas redes sociais, o grupo liderado pelo vocalista e guitarrista Dave Grohl disse:
"Enquanto dizemos adeus ao ano mais difícil e trágico que a banda já enfrentou, somos lembrados do quão gratos somos às pessoas que amamos e torcemos e a quem não está mais conosco.
O Foo Fighters foi formado 27 anos atrás para representar o poder de cura da música e a continuação da vida. Nos últimos 27 anos, os fãs construíram uma comunidade mundial, um sistema de suporte devoto que nos ajudou a passar pelos momentos mais difíceis juntos. Um lugar para compartilhar nossa dor e alegria, esperanças e medos, e nos unir no coral da vida por meio da música. Sem Taylor, nunca conseguiríamos nos tornar a banda que fomos. Sem ele, seremos uma banda diferente daqui para frente.
A continuação da vida
Alguns trechos da nota chamam atenção dos fãs que buscam sentido em certas frases. Uma delas inicia o segundo parágrafo: “O Foo Fighters foi formado 27 anos atrás para representar o poder de cura da música e a continuação da vida”.
À época, Grohl era baterista do grupo, mas começava a mostrar suas habilidades como compositor e multi-instrumentista. Algumas músicas que acabaram lançadas posteriormente pelo Foo Fighters, como “Alone + Easy Target”, foram criadas ainda nos tempos de Nirvana.
Em um episódio do documentário Sonic Highways, produzido pelo Foo Fighters e exibido pela HBO em 2014, Dave relembrou a reação de Kurt ao ouvir a canção:
“Ele parecia bem animado, disse que soube que gravei algumas coisas com o produtor Barrett Jones. Afirmei que sim e ele pediu para ouvir. Fiquei com medo de estar perto dele enquanto ouvia. Kurt ouviu e me deu um beijo no rosto, enquanto estava no banho.”
Um riff do próprio Nirvana também foi concebido por Grohl: “Scentless Apprentice”, faixa do álbum In Utero (1993). Em entrevista à CBSno ano de 2018 (via IgorMiranda), o músico relembrou que ele próprio tinha receio de mostrar suas criações para o frontman.
Um Foo Fighters diferente
Porém, a frase que mais pode gerar especulações em meio ao comunicado é curta e um tanto reflexiva. O trecho diz: “Sem ele [Taylor Hawkins], seremos uma banda diferente daqui para frente”.
Seria um tanto óbvio demais dizer isso ao referir-se apenas à mudança de formação. Se outro baterista entra no lugar de Taylor Hawkins, é claro que será uma banda diferente. Por isso, faz-se necessário refletir sobre uma situação recente na busca por outros significados.
Em maio do último ano, cerca de dois meses após a morte de Hawkins, pessoas próximas ao músico revelaram à Rolling Stone EUA que ele estava cansado da agenda de sua banda tempos antes de falecer. Até mesmo colegas de profissão, como os bateristas Matt Cameron (Soundgarden / Pearl Jam) e Chad Smith (Red Hot Chili Peppers), deram declarações nesse sentido.
Cameron, por exemplo, disse que Hawkins chegou a ter uma conversa franca com Dave Grohl dizendo que “não conseguiria mais fazer aquilo”, em referência à extenuante agenda de shows do grupo. Porém, a agenda de compromissos na retomada pós-pandemia ficou ainda mais intensa.
Em 2021, além de lançar um álbum (Medicine at Midnight) e gravar um filme que saiu no ano seguinte (Terror no Estúdio 666), o grupo realizou 30 apresentações pela América do Norte no segundo semestre de 2021 - incluindo uma performance no Madison Square Garden, em Nova York, que serviu como uma espécie de teste para o “mundo pós-pandêmico” conforme a vacinação ainda começava a avançar. Outras 50 datas foram anunciadas para 2022 com um raio de deslocamento ainda maior - contemplando também América do Sul, Europa e Oceania - e a possibilidade de encaixar mais agendamentos. Nada novo para um grupo que realizou mais de 90 shows em 2018, mais de 110 em 2015 e mais de 100 em 2011.
Na mesma entrevista à Rolling Stone EUA, Chad Smith confirmou que Taylor Hawkins sofreu um colapso e perdeu a consciência durante viagem de avião em Chicago. À época, a imprensa relatou a situação como tendo ocorrido com “um integrante do Foo Fighters”, sem a devida identificação. O baterista do Red Hot Chili Peppers foi além e disse que o problema de saúde ocorreu porque o amigo “não conseguia mais” seguir naquele ritmo.
Devido à repercussão negativa das declarações, tanto Cameron quanto Smith vieram a público em seguida para dizer que suas falas haviam sido retiradas de contexto. No entanto, em entrevista recente à Variety, o relações-públicas da banda, Steve Martin, reconheceu que os músicos podem, sim, ter dito algo nesse sentido. Ou seja, o problema existia.
E não era um problema novo. Em 2001, duas décadas antes de falecer, Taylor Hawkins sofreu uma overdose de heroína que o deixou em coma por duas semanas e quase o matou. Felizmente recuperado, ele adotou um estilo de vida saudável - que poderia ser comprometido a qualquer momento em meio à vida na estrada, com seus desafios e momentos de solidão.
Ainda que a causa da morte de Taylor Hawkins não tenha sido confirmada até hoje, exames periciais realizados no corpo do baterista encontraram 10 tipos de substâncias em sua corrente sanguínea. Opioides, antidepressivos e THC (maconha) foram algumas delas.
De volta à declaração do último dia 31 de dezembro, não é exagero pensar que o Foo Fighters será uma banda diferente também na forma de execução de suas atividades. Dave Grohl e seus parceiros prometeram voltar “em breve”, o que pode acontecer até mesmo em 2023. Porém, dificilmente com uma agenda tão intensa quanto a de anos anteriores.
Fonte: Rolling Stones